“Estamos numa corrida contra o tempo”, disse o secretário-geral da ONU António Guterres em entrevista à imprensa ao voltar a Dubai, para os últimos dias da COP 28. As propostas que ele defendeu também são das do governo brasileiro – que a conferência precisa ter algum acordo sobre o destino dos combustíveis fósseis, respeitando as diferenças de capacidade entre os países.
Guterres respondeu a um jornalista sobre se a conferência terá sido um fracasso se não chegar a nenhum compromisso sobre combustíveis fósseis. “Essa COP cobre sobre muitos aspectos”, disse ele. “Mas, na minha opinião, o aspecto central para medir o sucesso da COP será se chegará a um consenso na necessidade de abandonar os combustíveis fósseis em sintonia com o limite de 1,5°C da temperatura”.
Seguiu: "Isso não quer dizer que todos os países têm que abandonar os combustíveis fósseis ao mesmo tempo”, seguiu, citando o princípio das Responsabilidades Comuns, porém Diferenciadas da Convenção do Clima, (CBDR).
Por esse princípio, todos os países têm responsabilidade no desafio do clima, mas alguns têm mais do que outros (os países desenvolvidos).
Guterres lembrou que na COP 28 há várias lacunas que precisam ser fechadas – na redução dos gases estufa, nos recursos financeiros e na justiça climática. “Chegou o momento de adotar a máxima ambição e a máxima flexibilidade”, disse. “Os ministros e as negociações têm de ultrapassar as linhas vermelhas arbitrárias e as posições entrincheiradas”, continuou.
“No nosso mundo fraturado, a COP 28 pode mostrar que o multilateralismo continua a ser a nossa melhor esperança para enfrentar os desafios globais”, defendeu.
O GST, a sigla para o balanço geral dos avanços e retrocessos que o mundo conseguiu desde o Acordo de Paris – e deve ser um dos principais resultados da conferência – “deve oferecer um plano claro para triplicar as energias renováveis e duplicar a eficiência energética, e atacar a causa principal da crise climática: a produção e o consumo de combustíveis fósseis”, sintetizou.
“É claro que a transformação não acontecerá de um dia para o outro. A descarbonização criará milhões de novos empregos, mas os governos devem apoiar e proteger socialmente aqueles que serão diretamente afetados”, afirmou.
Ao mesmo tempo, disse que “as necessidades dos países em desenvolvimento altamente dependentes da produção de combustíveis fósseis também devem ser atendidas”.
Guterres defendeu, novamente, mais recursos para o clima. Mencionou, diretamente, “a reforma dos modelos de negócio dos bancos multilaterais de desenvolvimento, para aumentar maciçamente o apoio direto e mobilizar muito mais financiamento privado a custos razoáveis para os esforços de ação climática dos países em desenvolvimento.”
Disse, ainda, que o mundo precisa “de muito mais ambição na adaptação". "Esta deve ser uma prioridade não só para os países em desenvolvimento, mas para todos.”
Sem recursos para adaptação é como ter “um carro sem rodas”, comparou. “A duplicação do financiamento da adaptação para US$ 40 bilhões até 2025 deve ser um passo inicial para fazer com que pelo menos metade de todo o financiamento climático seja voltado à adaptação”.
Essa é uma disputa antiga entre o mundo desenvolvido e o mundo em desenvolvimento – os países ricos se preocupam mais em impulsionar a agenda do corte de emissões, mas os países em desenvolvimento sentem os impactos da crise do clima e não têm meios para se adaptar.
“Olhando para o futuro, os próximos dois anos são vitais. Em primeiro lugar, para estabelecer um novo e significativo objetivo financeiro global para além de 2025, que reflita a escala e a urgência do desafio climático. Em segundo, para que os governos preparem e apresentem novos planos de ação climática, as NDCs, que abranjam toda a economia, cubram todos os gases de efeito estufa e estejam alinhados com o limite de temperatura de 1,5°C”.
A jornalista viajou à COP 28 a convite do Instituto Clima e Sociedade (iCS)